Técnico e jogador, uma relação muito especial. A maioria das pessoas imagina que o jogador precisa de um bom técnico, que entenda de tênis, estratégias, etc., e pronto! Mas a coisa vai muito além disso.
Para começar, o bom técnico precisa ser fluente em pelo menos um idioma, de preferência o inglês. Precisa ser responsável, ter disponibilidade para viajar, conhecer o circuito (regras, jogadores, etc.), ter muita criatividade para enfrentar as mais incríveis situações e acima de tudo ser um super motivador. Eu costumo dizer que o técnico tem que ser uma mistura de pai, amigo, confidente, técnico de tênis, estrategista, preparador físico, nutricionista, fisioterapeuta, massagista, administrador financeiro, agente de viagens e psicólogo. E além de tudo isso, tem que haver uma “química” entre o técnico e o jogador, ou seja, um precisa gostar muito do outro. Se esta química não existir, o trabalho não vai render tudo o que poderia.
Então, vamos falar um pouco de cada atributo do “super técnico”.
Pai – Quando acompanhamos um atleta, nem é preciso dizer que temos uma responsabilidade maior que a de um pai. Cuidamos do atleta como se fosse nosso filho. Ficamos responsáveis pelo atleta 24 horas por dia, não apenas durante os jogos e treinos.
Amigo – Quando viajamos, estamos 24 horas por dia juntos. Acordamos, tomamos café, treinamos, almoçamos, treinamos novamente, jantamos, conversamos e vamos dormir. Já pensou fazer tudo isso com alguém que não seja seu amigo? Impossível! Acho que o item mais importante entre técnico e jogador é a afinidade, a cumplicidade. Sem isso, todo o resto já não tem importância. Sem essa afinidade, o jogador não vai produzir o máximo que poderia.
Confidente – No relacionamento entre técnico e o jogador, para que possa ser 100% produtivo, não podem existir segredos. O jogador precisa estar sempre à vontade com o técnico, contando abertamente todo tipo de problema para que este possa ajudá-lo.
Problemas extra-quadra afetam diretamente o desempenho do jogador. O técnico precisa saber se o jogador brigou com a namorada no dia anterior, se ele teve algum tipo de discussão em casa, etc. E para que o jogador possa se abrir com o técnico, a confiança tem que ser muito grande.
Técnico – O técnico precisa ter uma percepção muito aguçada, pois quanto melhor o jogador, fica mais difícil mexer na parte técnica. Além de muito detalhista, o técnico precisa conseguir fazer as correções necessárias em condições de treino precárias. Na maioria das vezes, são muitos jogadores para poucas quadras, e os jogadores tem pouco tempo para treinar.
Precisa ainda conhecer tudo sobre tipos de quadra (o jogo é um pouco diferente nos diferentes pisos – saibro, asfalto, grama ou carpete), condições climáticas (a bola fica mais rápida em tempo seco e mais lenta em tempo úmido), altitude (quanto mais alto mais rápida fica a bola), encordoamentos (a tensão da corda varia com a temperatura, altitude, piso da quadra, etc.), jogadores (constituição física), estilos de jogo, raquetes, roupas, calçados, equipamento em geral, enfim, tudo que pode influenciar o resultado de uma partida.
Estrategista – O técnico precisa ser um profundo conhecedor do jogo de tênis. Precisa conhecer bem todos os estilos de jogo, e as estratégias a serem usadas contra cada um deles. Tem que assistir a muitos jogos para conhecer os possíveis adversários do seu jogador. E na hora do jogo, tem que ser capaz de elaborar uma estratégia que seu jogador consiga executar. E também saber recuperar os músculos do seu atleta com maior rapidez após uma partida difícil, e até mesmo a relaxar a musculatura antes de um jogo importante.
Preparador Físico – Durante um torneio ou uma viagem longa, é a hora mais fácil do jogador deixar de fazer a sua “tarefa de casa” (preparo físico). É aí que o técnico tem que fazer o seu papel de preparador físico. Tem que saber o que fazer quando o jogador ganha e o que fazer quando o jogador perde, ou quando ele está com alguma deficiência no seu condicionamento.
Numa viagem, tudo é motivo para nos desanimar: o cansaço da viagem, a cidade estranha, a falta de uma academia, etc. O técnico tem que ter muita determinação e disciplina para não deixar que o atleta se acomode. Sem o técnico por perto, fica bem mais fácil deixar para o dia seguinte.
Nutricionista – Convivendo 24 horas com o jogador, o técnico precisa ter uma boa noção de nutrição. Saber o que o atleta deve comer, a que horas ele deve comer, o quanto ele deve comer, para que esteja bem preparado para os treinos, jogos, e, para que tenha um desgaste menor e uma boa recuperação. Em estados ou países diferentes, as mudanças na alimentação são grandes e as novidades também. Então, na falta de algum alimento, o técnico precisa saber por qual alimento este pode ser substituído.
Fisioterapeuta – O técnico precisa ter um bom conhecimento na prevenção e no tratamento de lesões. Precisa conhecer bem seu jogador para saber a hora certa dele parar, dar uma descansada. Em caso de lesão, na falta de um médico ou fisioterapeuta, o técnico tem que saber o que fazer para que seu atleta se recupere da melhor maneira possível.
Os jogadores estão sempre treinando e jogando no limite de suas forças. O calendário de torneios é brutal e estafante. Os jogadores precisam cuidar muito do corpo e ter muita disciplina, pois uma lesão no começo de uma viagem pode significar um enorme prejuízo para o jogador.
Massagista – A massagem ajuda o atleta a manter a musculatura saudável por mais tempo. Tendo o técnico como massagista, o jogador une o útil ao agradável. Massagistas nos torneios custam caro, e apenas os “top” do ranking mundial possuem massagistas particulares.
Administrador Financeiro – Na maioria dos casos, para que o jogador possa se concentrar 100% em jogar tênis, o técnico cuida de toda parte financeira. De acordo com o “orçamento”, o técnico vai escolhendo o meio de transporte para as viagens, as acomodações, a alimentação, e todos os demais gastos. E na maioria dos casos, o orçamento é curto. Então o técnico precisa ser bom de economia.
Agente de Viagem – Novamente, para que a atenção do jogador fique voltada somente para o tênis, o técnico também fica responsável pelas reservas de passagens e hotéis. Dependendo da época do ano e do lugar, essa pode ser uma tarefa extremamente árdua. Às vezes perde-se um dia inteiro para conseguir marcar uma viagem de um torneio para o outro.
Psicólogo – Uma das tarefas mais complexas e difíceis de um técnico, é a de psicólogo. Ele precisa ter um ótimo conhecimento da psicologia esportiva. Saber o que está se passando na cabeça do atleta em cada momento, para que ele possa ajudar da maneira correta.
Lidar com a cabeça, é uma coisa complicada. Cada um é de um jeito, cada um tem suas manias e costumes, e o técnico precisa absorver tudo para conseguir trabalhar bem. Ele precisa lidar de uma maneira diferente com cada jogador.
Estar longe de casa, das suas coisas, do seu conforto já não é muito agradável. Longe da família, dos amigos e da namorada pior ainda. Numa viagem longa, se as coisas não começam bem na 1a semana, o resto da viagem pode ficar comprometido. Somando a distância de casa e dos entes queridos com os maus resultados na quadra, o resultado se potencializa. Cabe ao técnico reverter a situação e motivar o jogador, para que ele possa desempenhar bem no restante da viagem. Saber conversar, levantar a auto estima do jogador, fazê-lo encarar a derrota de uma maneira natural é um pouco do que se precisa fazer para que o jogador tenha forças para continuar treinando forte, fazer preparo físico e encarar o próximo torneio animado e confiante. Parece que não é muito difícil. Só passando por isso para saber.
E para completar, o jogador precisa confiar e acreditar muito no técnico. Só assim, as coisas que o técnico disser farão efeito no jogador.
Antes do jogo, o técnico precisa saber motivar o jogador e prepará-lo para a batalha.
Quando o jogador estiver na quadra, o técnico precisa estar atento em todos os momentos. Precisa saber exatamente o que fazer e quando fazer. Manter-se calmo nas horas mais nervosas, um olhar sério pedindo mais concentração ou um melhor comportamento, um gesto para dar forças ao jogador numa recuperação na partida, e até uma instrução tática num momento delicado. As mentes precisam estar 100% conectadas.
E após a partida, se o jogador venceu é só reavaliar o plano de jogo e discutir certas jogadas. Mas se o jogador perdeu, um bom tempo precisará ser gasto para que o jogador assimile positivamente a derrota. Um trabalho muito difícil e delicado.
Depois de tantas atribuições, que fazem com que o nosso técnico seja um “super técnico”, resta dizer que o técnico que viaja com o jogador precisa ter uma boa educação, boas maneiras, bons hábitos (não beber, não fumar, não sair à noite), muita disciplina e excelentes princípios morais e éticos, para que o jogador possa lucrar ao máximo dessa convivência tão intensa. E os pais deste jogador possam assim ficar tranqüilos ao ter seu filho ou filha em tão boas mãos.